domingo, 6 de março de 2011

O CARNAVAL DA LUA


Unidos do Pão de Queijo entrando na passarela!!!!


Ei você aí... me dá um pão de queijo aí....
Ô abre alas que o pão de queijo quer passar ....
O teu pão de queijo não nega mulata, porque ele é dourado na cor....
Tava jogando sinuca quando um pão de queijo maluco me apareceu ...
Atravessamos o deserto do Saara, o pão de queijo estava quente e queimou a nossa língua ...
Você pensa que pão de queijo é biscoito, pão de queijo não é biscoito não ...
Olha o pão de queijo do Zezé, será que ele é? Será que ele é? ....
Oh pão de queijo porque estás tão triste? Mas o que foi que te aconteceu? ....
Mamãe eu quero. Mamãe eu quero. Mamãe eu quero um pão de queijo...

- Nada disso! exclamou a Lua. - Não tá bom! Acho que preciso de umas aulinhas de música.

- Por que isso, Lua? – perguntou a Pipoca.

A branquinha estava há dias cantarolando pelos cantos, tentando fazer rimas. Ninguém entendia nada. Isso era preocupante porque ela não estava reclamando da falta das aulas que o tio Chicão ficou de dar. Justamente ela que não perdia um recreio! Muito grave!

- Nada não! Estou apenas procurando a música ideal – respondeu a filhote.

- Ai e ai. Ideal pra quê, Lua? – perguntou uma temerosa Azeitona, já antevendo peraltices.

- Pro meu bloco de carnaval, ué? – respondeu a Lua.

- Minha nossa! – exclamou o Pingo lá de longe. – Imagino o que virá depois disso!

- Ué? O que tem de errado na Lua querer fazer um bloco de carnaval? – perguntou a Tetê. – Carnaval é alegria e isso é muito bom.

- Isso é verdade – falou a Lulu. – O pelo da gente fica macio e brilhante.

- Mas a pergunta que não quer calar ... – falou a Chica – é onde será a apresentação desse bloco. Será aqui em casa? No meio dos livros da Zambézia? Entre as partituras das músicas do Tom Jobim e do Edu Lobo? Tenho a impressão que não vai ser uma coisa auspiciosa.

- Claro que vai ser aqui – respondeu uma Lua indignada. – Mas antes estou procurando um canil italiano para nos ajudar e dar o tal do patrocínio: Unidos do Pão de Queijo vai sair genteeeeee.

- Canil italiano? Santos ossos! – perguntou a Tata. – O que tem a ver o mastim napolitano com o carnaval?

- Ué! Simples e econômico, falou a branquinha. – Vejam vocês: os mastins devem comer macarrões com queijo porque eles são italianos, certo? Aí podemos pegar os macarrões talharins e emendar uns nos outros até ter um monte de serpentinas. Depois é só recortarmos o queijo em rodinhas pequeninas para fazer de confete.

- Essa foi brava – exclamou a Tuca. – De onde ela tirou isso? Onde já se viu emendar macarrão e picotar queijos? E os mastins comem mesmo macarrão? Não acredito nisso!

- Por que? O que tem de errado? Assim podemos cantar uma Marcha do Pão de Queijo, pular um bocado, jogar serpentinas macarrônicas e confetes queijudos uns nos outros e depois da festa é só comer que tudo fica limpinho, - explicou a Lua. – Pode ser aqui na sala sim!

- Não é que faz sentido? – falou o Kousky.

- Também acho – disse a Lulu. – A gente nem se suja e nem tem essa possibilidade de melecar a pata. Parece bom! E eu poderei me fantasiar de odalisca canina, lindíssima. O papai não precisará limpar nada. Poderemos pegar aquelas luvas amarelas que ele usa e encher de ar e enfeitar as paredes.

- Pelos ossos sagrados – exclamou a Sasha. – Acho que não vamos conseguir engolir tanto macarrão e nem tanto queijo. Além disso, quem disse que as nossas mamães vão deixar?

- Isso é. E tem mais – interferiu a Chica – como fazer contato com canil de cães mastins napolitanos pra entregar toda essa comida? Como vamos pagar tudo isso? Onde vamos encontrar um monte de fantasias de cachorros mesmo que seja de humanos? Não vai dar certo. Parece aquela fábula dos ratos com o gato. A idéia até pode parecer boa mas ....

- Isso é verdade, falou a Lua. Acho que não temos como pagar, mas se não temos o canil podemos pegar o queijo na despensa da mamãe. Teremos os confetes. As fantasias podem ser qualquer coisa que imaginemos. O que vale é a folia e ...

- Nem pensar, menina Lua. Nem pensar! – disse um Tio Chicão sonolento, mas assustado com o que ouvia. Imagine o que é o barulho de quase sessenta patas batendo no chão e dezenas de focinhos fazendo auuuuuuu. Nem pensar! Eles é que seriam despachados pra Zambézia na caixa da guitarra do papai. É sim! Além disso, que história era essa de roubar macarrão da despensa?

- Por que, tio Chicão, perguntou uma chorosa Lua. – O que tem de errado em se divertir?

- Nada de errado na diversão, menina Lua. Ao contrário, diversão faz parte da saúde de todos os seres. Mas carnaval não é festa pra cachorros, explicou Tio Chicão ao mesmo tempo em que pensava como seria interessante uma festa como aquela inventada pela menina Lua. Tinha que reconhecer que seria algo bom. Não se podia fomentar a fuzarca, as peraltices, muito menos os roubos às despensas, mas também cortar a imaginação e a chance de exercitar a fantasia era pior ainda. Pensando nisso chamou todas as patas e focinhos presentes e mandou mensagens pros invisíveis também aparecerem. O Bim chegou atrasado porque estava na sessão de acupuntura e isso o tornava lerdo e sonolento. Mesmo assim ... falou barulho ... chamou-se o Bim. Ele tinha conhecimento de causa porque era o mascote da Unidos da Academia.

- Meninos e meninas – falou tio Chicão. – Pensando na idéia da menina Lua resolvi que vamos fazer um carnaval aqui em casa.

- Obaaaaaaaa – foi um latido coletivo.

- Mas ...

- Lá vem as regrinhas chatas – exclamou a Jujuba. – Sempre tem as regrinhas chatas!

- ... vamos fazer um carnaval canino.

- E o que é um carnaval canino? – perguntou o Pingo que já se antecipava e pensava como perfuraria seu edredom para abrir dois buracos por onde pudesse olhar e sair fantasiado de fantasma do frio.

- Vamos imaginar fantasias e contar para os demais – explicou tio Chicão.

- Mas podemos cantar? – perguntou a Azeitona. Ela se considerava uma autêntica cantora de voz negra, de apelo e pelo irresistível.

- Podemos cantar sim – falou tio Chicão, um tanto quanto incomodado com a idéia daqueles uivos chamarem a atenção de todo o condomínio. Poderia gerar problemas mas ... era carnaval. E cá entre eles ... os humanos andavam cantando cada porcaria .... ora bolas!

- E a gente vai só imaginar? Nem um confete de queijo ou uma serpentina de macarrão? – choramingou a Lua.

- Isso não, menina Lua. Só podemos comer ração! – mais uma vez explicou tio Chicão.

- Tá certo! – concordou a Lua, muito rapidamente ... o que causou espanto dos demais.

- Aí tem coisa! Falou o Teco para a Chica.

- Ela vai aprontar! Falou o Pingo para a Sasha.

- Espere que lá vem coisa! – Falou a Lulu para o Kousky.

- Seus bobões! Falou a Lua para todos. – Nada disso. Vamos nos sentar e usar a imaginação como propôs o tio Chicão.

Surpreendendo todo mundo, a branquinha se ajeitou em cima da sua almofada e se colocou na escuta como uma boa aluna. Surpreendeu ainda mais quando respondeu a primeira pergunta do tio Chicão sobre as origens do Carnaval.
- Trata-se de uma festa que remonta aos anos antes da era cristã, lá no Egito antigo com os cultos a deusa Ísis. Quase sempre as festas se referiam aos finais das colheitas e as pessoas pintavam os rostos, bebiam e dançavam – explicou uma Lua muito séria, de orelhas em pé.

- Continue menina Lua – falou um maravilhado tio Chicão. – Continue sim!

- Bom, talvez o carnaval seja uma das festas pagãs de Roma onde ocorriam as orgias ...

- O que é orgia? – perguntou o Teco.

- Orgia é libertinagem, explicou a Sasha.

- Piorou! O que é libertinagem? – perguntou o Pingo.

- Meninos e meninas, orgia é uma festa onde há desordem, onde não há controle dos atos. E ...

- Todo mundo pega o pão de queijo do outro? – perguntou a Lua

- Mais ou menos isso, menina Lua. – Trata-se de uma festa sem controles onde as coisas mais perigosas podem acontecer.

- Sei! Roubos dos pães de queijo! Hum! Que perigo!

- Então não é uma coisa boa? – questionou a Tila

- Não, menina Tila. Trata-se de uma festa exagerada, com bebidas em excesso e violências.

- Credo! Que porcaria! E se o carnaval é isso ... não quero mais – exclamou a Chica.

- Não! Não! A menina Lua está apenas mostrando as possibilidades de onde podem ter surgido as idéias que levaram ao nosso carnaval, o dos dias de hoje. Continue menina Lua e pode pular o pedaço da orgia.

- Certíssimo. Então, com a era cristã a Igreja Católica tentou acabar com essas festas pagãs. A Quaresma é um período de festas que se inicia no Natal e que termina na quarta-feira de cinzas.

- Puxa! Que carnaval comprido! – exclamou o Teco.

- Não é o carnaval, Teco, prosseguiu a Lua. - É o final da Quaresma. No último dia antes do término, ou seja, na terça-feira os cristãos podiam comer carne. Por isso era conhecida como Terça-Feira Tuca...

- Como é que é? Eu não tenho nada a ver com isso – gritou a Tuca.

- O que eu quis dizer é que era a Terça-Feira Gorda, e como você é ...

- .... Menina Lua! Pare com isso! – reclamou tio Chicão. – Retome sua apresentação com seriedade e respeito!

- Sim senhor! Noooossa! Ele ficou bravo! Todos os pelos ficaram levantados! Auuuuuuu – choramingou a branquinha, no mesmo tempo em que se ajeitava melhor. – Continuando, a terça feira gorda era muito comemorada já que era o fim da Quaresma e daí pode ter vindo a idéia do Carnaval.

- Certo, menina Lua. Mas não foi apenas isso que caracterizou o Carnaval. Temos outros elementos que foram se acumulando ao longo dos tempos. No período medieval os festejos eram com jogos e disfarces, brigas com confetes e desfiles de carros alegóricos. Nas eras posteriores já apareceram novos elementos como os bailes de máscaras. Nos meados do século XVIII a comédia italiana deu três personagens seus para os festejos carnavalescos: o pierrô, a colombina e o arlequim. O Pierrô era uma figura ingênua, romântica e sentimental ...

- ... como o Pingo? – exclamou a Lua.

- ... e era apaixonado pela Colombina ...

- Como a Sasha? Branquinha e de cabelos enrolados? – continuou a branquinha e sem receber atenção do tio Chicão.

- ... que era uma caricatura das criadas de quarto, sedutoras e volúveis – continuou expondo tio Chicão ao perceber os rosnados da Sasha para a Lua. Houve necessidade de intervenção.

- Meninas brancas! Vamos parar com isso ou suspendo a brincadeira!

- Tio Chicão! Foi a Lua quem começou e ...

- Não fui não! Eu só achei que se o Pingo é o Pierrô, a Sasha tem que ser a Colombina porque senão não combina! Ih! Rimou! – exclamou a filhote.

- Chega de comparações. Vamos nos deter nas informações, caso contrário nada dará certo neste nosso carnaval, - falou Tio Chicão. – O que acontece é que a Colombina também namora o Arlequim que é um palhaço inimigo do Pierrô.

- Vixessanta! Um triângulo amoroso! – exclamou a Tila. – Onde isso irá parar?

- No Bloco do Pão de Queijo – gritou a Lua. – E chega de explicações, tio Chicão. Queremos cair na folia. Hoje é o nosso primeiro dia de Carnaval. Deixe mais aulas pros próximos dias.

- Tá certo, menina Lua. Vamos então pensar em nossas fantasias. A da menina seria o quê?

- Um imenso pão de queijo de orelhas pontudas e rabinho abanando – falou a Lua.

- Eu serei um cachorro fantasma debaixo do meu edredom – explicou o Pingo.

- Eu vou usar uma máscara lindíssima, falou a Lulu.

- Vou colocar minha coleira de pedrinhas pontiagudas e serei uma verdadeira punkdog – falou a Jujuba.

E aos poucos todos foram colocando suas imaginações para funcionar. Cada um escolheu uma forma de brincar esse carnaval dos animais. Imaginavam, explicavam, fechavam os olhos e viam a fantasia surgir. E começaram a comemorar cantando cantigas de roda que todos conheciam. Assim foi até que a campainha tocou. Ao abrir a porta, papai recebeu uma pizza colorida com pimentões verdes, tomates vermelhos e milhos amarelos, coberta com mussarela e salsinha verde, azeitonas pretas e cebolas brancas. Foi o fim do carnaval e o começo do ritual de cercar a mesa, abanar os rabos e esperar pedacinhos de cada coisa.

Mas a Lua ainda tinha uma pergunta:

- Tio Chicão, por que tudo sempre acaba em pizza? Hein? Até meu carnaval acabou assim! Hunf! Vou contar tudo pra tia Cris e pra tia Eneida.

Não houve como não rir.

Contudo, ela não desistiu! A branquinha tentava separar os milhos para fazer seus confetes. Podia acabar em pizza, mas era uma meio carnaval, meio mussarela.

Obaaaaaaaaaaaaaaaa.

Marly Spacachieri
Março de 2011.